Nos Artigos
«Estudos numa Escola da Aldeia 15 a 18» (publicados nas Revistas da
Enciclopédia Damista de Setembro a Novembro de 2001) divaguei à volta de uma
conjetura que, na altura, enunciei da seguinte forma:
Para
confirmar esta conjetura mostrei vários exemplos de que destaco estes quatro
por ordem de posição do PN (da casa 17 à casa 30):
A característica comum destes 4 trabalhos
é que, a DN, estando no Rio, com todas as casas do rio livres de qualquer
cavilha, sofre um ataque direto de uma Dama Branca que, deixa às Negras a única
opção de abandonar o rio para não perderem de imediato.
No artigo “Estudos numa Escola da Aldeia 18” apresentei algumas posições em que a DN
não se encontra atacada diretamente, mas está condicionada pelo “encosto” de um
Peão Branco.
Sem qualquer condicionamento da DN,
em «TOTAL
LIBERDADE» como lhe chamei, lamentei-me, no artigo «Estudos numa Escola da Aldeia 17», de não ter conseguido encontrar nenhuma posição nas
Regras do Jogo de Damas Clássicas.
É sabido nas Damas Clássicas, que 2DB
+ PB contra DN no Rio + PN24, as Brancas ganham se conseguirem formar a Bateria
PN24 + PB20 + DB15 sem que as Negras consigam se “desfazer” do PN24.
Mas este artifício da Bateria não se
enquadra na ideia de «TOTAL LIBERDADE» uma vez que o PN24 está impedido de se sacrificar.
O PN24 encontra-se, digamos assim, “sequestrado”
pelas Brancas.
Contentei-me então, em mostrar apenas
um exemplo explicativo de «TOTAL LIBERDADE» mas tive de me socorrer das Regras das Damas
Brasileiras que, como é sabido, os Peões Negros, para além da tomada para a
frente, têm que, de igual modo, capturar para trás também.
Repare-se como a DN, com a primazia do lance na posição inicial, tem:
- todas as casas do Rio livres para
poder jogar
- não está atacada
- não sofre nenhum tipo de
condicionamento pela parte das Brancas
- e pode abandonar o Rio
Veja-se também como os Peões Negros:
- podem movimentar-se
- nenhum deles está, portanto,
encravado numa bateria pré-preparada.
Ou seja: as Brancas dão TOTAL LIBERDADE às Negras permitindo
até que a DN se desloque livremente no Rio mas, mesmo assim,… as 3 Damas Brancas
acabam por ganhar o Jogo!
A Lei de que, uma Dama Negra empata,
contra três Damas Brancas, desde que possa jogar livremente no Rio, mantem-se
válida e intransponível!
No entanto, se as Negras possuírem
um ou mais peões no tabuleiro, para além da DN, esta Lei começa a não ser
válida em todos os casos, mesmo sem que se
utilize o artifício da Bateria PN24 + PB20 + DB15.
Com este
artigo pretendo pois, historiar este Tema «TOTAL LIBERDADE» e, sobretudo, render uma justa homenagem
ao seu primeiro Autor nas Regras Clássicas que, como veremos, é o Henrique
Guerra Filguera, o autor deste Blogue TRES E DAMA!
É em
Janeiro de 2002, que algo de singular acontece no Jogo das Damas Clássicas! Henrique
Guerra traz à luz do dia, na Enciclopédia Damista, a seguinte miniatura de 6
peças:
Sem a utilização do artifício da Bateria PN24+ PB20+DB15, é o primeiro trabalho nas Damas Clássicas (que eu conheça) em que, uma Dama em TOTAL LIBERDADE no Rio, tem a primazia do Lance mas…, mesmo assim, perde contra apenas 3 peças adversárias!
O Dr. Sena Carneiro e Manuel Melo fizeram
o seguinte comentário a este problema na Enciclopédia Damista:
“Trabalho de Antologia! Um lampejo de génio! Parabéns ao seu Autor!”
Por ser o primeiro trabalho no Tema TOTAL LIBERDADE nas Damas Clássicas, eu
comparo esta miniatura a um trabalho de Pedro Ruíz Montero ou de um Juan
Timoneda e quanto mais a aprecio mais valor lhe atribuo!
É uma opção minuciosamente selecionada,
com todo o rigor, por um Compositor exigente que privilegia os mais elevados
padrões na arte da composição.
Compare-se a opção escolhida pelo
Henrique Guerra no ED Nº5079 com a seguinte transposição simétrica (também dá
com a DB30 em 20 e DB6 em 17):
Para mim, é mais do que evidente, que
a escolha da força mínima Branca (apenas 2DB+PB em vez de 3DB), a chave
imprevisível e a manobra da DB na linha 17-30 na solução do ED Nº5079 do
Henrique Guerra, deixam a estética visual que uma simetrização possa acrescentar,
a anos-luz de distância, mesmo que, se acentue o facto de as Negras, na simetria,
ainda possuírem mais um PN que no trabalho do Henrique Guerra.
Em Junho de
2002, Henrique Guerra, como que a querer dizer ao mundo que não compôs o ED
Nº5079 por acaso, publica na Enciclopédia Damista, com o Nº5111, uma nova Obra de Arte mas agora em formato
variável!
Definitivamente
Henrique Guerra Filgueira entrou para a História do Jogo das Damas Clássicas
com estes 2 trabalhos: o ED Nº5079 e este ED Nº5111!
Analisando
criticamente este segundo trabalho do Henrique, eu diria que tem uma solução mais
intuitiva que a solução do espantoso ED Nº5079,
mas não é de admirar… o ED Nº5079 é imprevisível de princípio ao fim!
Vejo também que, neste caso, o Autor se autolimitou
(talvez pelo o encantamento da ideia em variável) e não explorou completamente
as potencialidades do bloqueio. É que, com apenas o acréscimo de um PN, esta ideia
poderia ser enriquecida com a repetição do bloqueio, ora com a DB em 8, ora com
a DB em 29.
Repare-se então
nesta adaptação, uma miniatura de 8 peças, que mantem à mesma a variabilidade,
embora de uma forma mais ténue, mas em que há repetição do Bloqueio devido à
presença do PN extra na casa 29:
Mais de 10 anos se passaram desde a publicação do ED Nº5111 que é, como vimos, o segundo trabalho no tema “TOTAL LIBERDADE”.
Neste
entretanto, não vi surgir mais nada de similar a estes excecionais trabalhos do
Henrique Guerra, o que prova bem da sua singularidade.
Assim, Henrique
Guerra, direta ou indiretamente impregnou de “TOTAL LIBERDADE” as seguintes
casas do tabuleiro:
Por várias
ocasiões, na Enciclopédia Damista, eu utilizei a visualização do padrão de
distribuição dos resultados de um determinado tipo de final, para me poder
orientar numa linha de pesquisa, para poder “carregar o ânimo” com aquela intuição que nos diz que estamos no
caminho certo!
No artigo “Curva de Distribuição Normal” – na Enciclopédia
Damista de Dezembro de 2003, cheguei mesmo a escrever:
“A emoção diz-me, “por experiência sentida” que
o tabuleiro possui uma matemática intrínseca verdadeiramente harmoniosa e bela.”
Foi com este espirito, que, ao
contemplar este Padrão Inicial, me
apercebo da descontinuidade da casa 23. Este “buraco negro” não me pareceu nada
normal.
Sobressai mesmo de uma forma aberrante…
difícil de explicar.
Porquê 14, 19 e 28 e não 14, 19, 23 e 28?
Novamente a intuição, gerada pela
visualização do padrão de resultados, me iria brindar com mais uma fascinante aventura
na Composição Artística!
O ponto de partida? Os exemplos conseguidos
pelo Henrique Guerra e a “certeza” de que, este bloqueio com DN na casa 23, teria
que existir dada a anormal descontinuidade do Padrão Inicial.
Eis, então, o resultado dessa
aventura na busca de um Bloqueio no Tema TOTAL
LIBERDADE, que preenche a lacuna da casa 23 e que, por transposição, completa
também a casa 10!
Inéditos de Eduardo Valente
Uma vez tomado o Rio, as Brancas ganham pelo FPB Nº971 da Enciclopédia
Damista em que a Base é feita com as Damas Brancas em 9, 17 e 23.
Como é
possível que esta ideia tão simples e tão frequente em vários finais quando
existe PB4 e PN8, se tenha mantido escondida durante tanto tempo?!
A beleza deste padrão é ainda acentuada pela particularidade
da casa 5.
Esta casa possui
uma característica especial!: Na casa 5 não
é possível bloquear uma DN no Tema TOTAL
LIBERDADE nas regras das Damas Clássicas. Tal só é possível nas Regras
Brasileiras.
Como ficou
demonstrado, o Padrão do Tema TOTAL
LIBERDADE, nas Damas Brasileiras preenche as casas 5, 10, 14, 19 e 28, mas nas Damas Clássicas, este Padrão é mais
limitado pois a casa 5 é excluída. É um pouco atrevida
esta afirmação mas considero-a como a melhor conjetura no meu atual estado de conhecimento do Jogo das Damas Clássicas.
Eu não
preciso de provar que “todos os melros
são pretos e têm bico amarelo”. Se um Damista
não concordar com esta afirmação, só tem é que encontrar um (apenas um só chega…)
“melro branco de bico azul“ por
exemplo!
Na
Enciclopédia Damista, cheguei a mencioná-lo uma vez:
- Numa
determinada percentagem de posições, o tabuleiro “zomba” (“chacoteia”, “brinca”)
com o solucionista/compositor! Este é, para
mim, mais um desses casos.
No Jogo das
Damas Clássicas, para além das casas 1 e 32, a casa 5 constitui também um refúgio inexpugnável
na defesa de uma DN no Rio contra 3 Peças Brancas!
Esta casa 5 possui,
portanto, uma característica que distingue o Jogo de Damas nas regras Clássicas
do Jogo de Damas nas regras Brasileiras!
Evidentemente
que esta diferenciação é fruto da desigualdade das regras de captura das duas
modalidades do Jogo das Damas, e é interessante vislumbrar as consequências
inesperadas que se podem gerar pelo simples facto de se adaptar, ou não, a
captura para trás dos peões.
Nas Damas
Brasileiras, como existe uma panóplia de manobras mais vasta devido à
potencialidade gerada pela regra dos Peões serem obrigados a capturar também
para trás, os resultados desequilibrados tendem a aumentar se comparados com um
sistema de regras menos potenciador, como é o caso das Damas Clássicas, em que
os peões só capturam para a frente.
Isto verifica-se
também com a Lei da Qualidade. Há finais que
só se ganham se for utilizada a Lei da Qualidade. Sem esse
recurso, o bando mais forte não consegue ganhar.
Um exemplo deste
caso é o FPB Nº831-C- da Enciclopédia Damista que, por acaso, até conheço bem! Br:
(4), 22, 24, (29) Pr: (1), 29, 30 JBG.
Eduardo Valente, 20-8-2013
1 comentario:
É um enorme prazer voltar a poder contar com a colaboração do maior e melhor "compositor/problemista" de todos os tempos neste blog.
Um artigo de Eduardo Valente é uma obra-prima.
Eduardo Valente na composição é como Mozart na música, Picasso na pintura, e Miguel Ângelo na escultura... simplesmente "the best"...
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